quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Treino Mental - Compostura


A teoria dos “semáforos” implica sempre a existência de “contágios”. Com efeito, quando alguém lidera pelo exemplo deve ter em conta que o melhor meio para colocar a sua equipa num semáforo verde é estar, ele próprio, num estado de “semáforo verde”. Mas como atingir esse estado tão desejado? Aqui estão algumas das rotinas usadas por atletas de alta competição, antes de um treino ou de uma prova, para atingir o tal semáforo verde.

1)      Revisão dos planos de jogo ou dos dados estatísticos: se fores um atleta que gosta de rever mentalmente o plano para o jogo, deves focar-te em 3 a 5 questões-chave que aumentem as probabilidades de tu e a equipa terem sucesso;

2)     Visualização: podes visualizar-te a passar por momentos importantes do treino ou jogo. Imagina-te a jogar da forma mais eficaz possível, seja a executar as diferentes tarefas do jogo, seja a atacar o teu adversário directo;

3)     Reflexão/Oração: podes preferir isolar-te e “esvaziar” a cabeça de modo a fortalecer o teu estado de espírito para os momentos que se avizinham. Se as tuas crenças religiosas são uma fonte de força para ti, uma pequena oração pode ser o suficiente (Exemplo de Pelé: "Meu Deus, por favor faz com que a minha equipa ganhe; mas se não ganhar, pelo menos que não perca; e se tiver que haver empate ao menos que seja 5 a 5 para o povo ir embora satisfeito");

4)     Ouvir música: podes preferir ouvir música enquanto te preparas para competir. A música é, obviamente, uma escolha individualizada, pelo que os headphones são obrigatórios. Se achas que jogas melhor quando estás enérgico, encontra uma música que te deixe assim. Caso contrário, se é relaxado e calmo que o teu desempenho melhora, encontra uma música que te acalme. A música é um excelente meio para encontrar o estado mental mais adequado ao momento que se avizinha;

5)     Conversar com colegas de equipa: se fores um atleta que gosta de relaxar conversando com os colegas (e não se isolando ou pensando demais na competição), provavelmente o melhor será brincar informalmente um pouco com eles para evitar que a ansiedade se instale;

6)      Ver vídeos: uma óptima forma de atingir o estado desejado é observar vídeos de equipas de sucesso (inspiradoras), se possível complementados com música;

7)     Dormir ou tomar um duche: se preferires avançar para a competição depois de um momento de descanso, o melhor será fazer uma pequena sesta após o almoço. Outra sugestão é um duche para refrescar;

É fácil mantermo-nos no semáforo verde quando a equipa está a ganhar, quando as faltas são bem marcadas e quando estamos a jogar bem. Bem diferente é a realidade quando as coisas não correm como desejamos. É nesse momento que a capacidade de liderança de cada um de nós emerge. A “chave” encontra-se no semáforo amarelo. Porquê? Porque como seres humanos que somos, é impossível estarmos no semáforo verde 100% do tempo. O segredo deste processo é conseguir identificar quando entramos num semáforo amarelo.

É importante, neste ponto, relembrar que somos nós que controlamos a cor do semáforo em que nos encontramos. Muitas vezes atribuímos a causa da mudança de cor a um determinado episódio ou evento. Nada mais errado. Não é a situação que causa a nossa mudança do verde para amarelo ou vermelho, mas sim a nossa interpretação dessa(s) situação(ões). Muda a tua interpretação e mudarás a cor…

Diagnosticar a aproximação de um semáforo amarelo é, então, crucial para manter o controlo da situação e, consequentemente, a compostura. Assim que diagnosticamos a cor amarela, a tarefa é focar a nossa atenção de modo a reentrar no semáforo verde. Se não reconhecermos os amarelos ou se não tivermos capacidade para refocar eficazmente, estamos a caminho da cor vermelha. Como é óbvio, depois de entrar no vermelho é muitíssimo difícil voltar ao verde, pelo que é decisivo conseguir refocar a atenção enquanto estamos no amarelo. Se conseguirmos diagnosticar a tempo o afastamento da cor verde, uma das seguintes estratégias pode ser utilizada para regressar rapidamente.

a)     Abrandar: o esforço para refocar no que é importante deve começar pelo abrandamento do ritmo a que estamos a jogar/treinar. Aperta os atacadores, ajusta o equipamento, põe a camisola por dentro dos calções, bebe água, etc. Faz qualquer coisa que te permita ter algum “espaço” para estancar o momento negativo. Durante estas pausas pode ser usada qualquer das seguintes estratégias para refocar no essencial;

b)     Focar nos aspectos controláveis: quando estamos num amarelo ou num vermelho, a realidade tende, como vimos antes, a acelerar mais do que desejamos. A melhor forma de controlar a situação é ganhar o auto-controlo físico e emocional. É decisivo perceber o que controlamos e o que não controlamos nestas situações. Aspectos que não controlamos são, por exemplo, as decisões do treinador, colegas de equipa, árbitros, público, oficiais de mesa, adversários, condições ambientais, equipamento, viagens, obrigações académicas, tempo de jogo, jornalistas, expectativas de amigos e familiares, etc. Exemplos de aspectos que controlamos e sobre os quais nos devemos conseguir focar rapidamente são: atitude, esforço, compromisso, confiança, alimentação, descanso, respostas às diferentes situações, comunicação, linguagem corporal, preparação, etc. Sempre que te encontres numa situação difícil a primeira pergunta deve ser: é controlável ou não controlável? Se não é controlável é urgente parar a subida da frustração e ignorar ou ajustarmo-nos à “nova” realidade. Se é controlável, deve ser assumida a responsabilidade por readquirir o controlo e agir imediatamente. Controlar os aspectos controláveis parece simples (e é), mas a maioria dos atletas tem dificuldade em libertar-se do que está fora do seu controlo. O treino serve para disciplinar as capacidades de refocar sob stress e de assumir a responsabilidade pelos aspectos controláveis. Só assim se atingirá o sucesso;

c)      Focar no presente: a maioria das vezes que atingimos o amarelo deve-se à frustração associada a erros cometidos no passado. Quantas vezes ficaste frustrado com uma falha no início de um jogo e essa falha te acompanhou por minutos, horas ou até dias? Muitos atletas têm dificuldades em recuperar de um erro ou de uma falha. Em vez de avançarem, ficam presos na repetição mental da falha, aumentando assim a frustração (e isto é especialmente verdade para os mais perfeccionistas). E assim acabam a lutar contra si próprios porque uma porção da sua atenção ainda está no passado. E se uma porção está no passado, então o foco não está 100% no presente. Algumas técnicas para focar no presente são as seguintes:

i)                  Respirar fundo: pode ser útil para libertar frustrações passadas e distracções, sobretudo quando expiramos;

ii)                Diálogo Interno + Palavras-Chave: pode ser bom iniciar um diálogo interno do tipo “toma atenção a este aspecto”, “uma coisa de cada vez” ou “foca-te nisto e foca-te já”. O treinador de Duke, Mike Krzyzewski usa a expressão “próxima (jogada)!” para que os jogadores esqueçam os erros do passado recente e se foquem nas posses de bola seguintes;

iii)               Aprender a lição: é sempre bom converter os erros e falhas em lições. Em vez de focarmos a atenção no que não fizemos bem, foquemo-nos na lição aprendida e na forma como essa lição será aplicada daí em diante. É inteligente tentar aprender o máximo sobre nós próprios, colegas, treinadores e adversários para que essa informação aumente as probabilidades de sucesso no futuro.

d)     Focar no que é positivo: devemo-nos focar nas acções positivas que queremos ter e não nos erros que queremos evitar. Se nos focarmos nos aspectos negativos que queremos evitar, o nosso corpo e a nossa mente confundem-se e surge a frustração. Ao visualizar e imaginar acções positivas, o cérebro pode focar-se mais eficazmente em fazê-las mesmo acontecer.

e)     Focar nos processos: o resultado de uma competição está directamente dependente da nossa habilidade para nos focarmos nos processos dessa mesma competição. O foco deve ser contínuo e nas pequenas acções (fundamentos) que nos colocam numa melhor posição para obter o que ambicionamos. Qual é o processo que conduz ao sucesso no nosso jogo? O que é preciso para conseguir os resultados pretendidos? Na esmagadora maioria das vezes este foco é nas “pequenas” variáveis que controlamos: assiduidade, compromisso com treinos de qualidade máxima, abordar todas as questões com atitude positiva, desenvolver as diferentes forças (sobretudo física e mental), trabalhar em conjunto com colegas de equipa e treinadores, etc. Ao trabalhar estas componentes do processo de conquista, estamos a criar as condições para mais facilmente atingirmos os resultados ambicionados.

Jogar com compostura não implica que sejamos robots desprovidos de emoções. A compostura é o acto de aprender a gerir positivamente as emoções. As emoções positivas devem ser expressas, dentro do que é razoável. Celebrar o nosso sucesso e o dos nossos colegas de equipa deve ser feito, sempre sem perder a perspectiva do respeito pelo adversário (atenção que não queremos dar-lhes doses extra de motivação!). As emoções positivas são então um factor determinante para o sucesso nos desportos colectivos e cada um de nós pode ser o motor desta positividade. Por outro lado, assim como é positivo mostrar as emoções positivas, devemos fazer o nosso máximo para “esconder” as emoções negativas que vão surgindo. Por vezes isto implica disfarçar a frustração ou, pelo menos, tentar aligeirá-la para evitar perdas de controlo. Se não conseguimos controlar as nossas emoções negativas, o resultado será a distracção dos nossos colegas de equipa e o possível contágio dos mesmos. Daí que as técnicas apresentadas neste texto devam ser experimentadas e treinadas, de modo a mantermo-nos a nós e aos nossos companheiros de equipa sempre no semáforo verde do controlo emocional. 

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