Como já repararam, dou muita importância à auto-percepção como factor decisivo para o eficaz processo de tomada de decisão e consequente alto rendimento desportivo. Conhecer o modo de funcionamento do cérebro assume então enorme importância, não só no desenvolvimento cognitivo mas sobretudo ao nível do controlo emocional. A relação consciente/subconsciente passou a ser um aspecto intrigante depois de um episódio que vivi em 1995, então ao serviço do Beira-Mar.
Faltava cerca de meia hora para terminar mais um normal treino nocturno. Estava já a decorrer a fase de jogo quando me vi forçado a recuperar defensivamente numa situação de 1x1 em campo aberto, com vantagem para o atacante. A uma simulação do atacante reagi com uma tentativa de desarme de lançamento mas... saltei demais. Ou então saltei mais do que devia... Nesse salto (e uma vez que o atacante se baixou após a simulação) passei por cima do meu colega e atingi-o nos ombros com os meus pés. Do desequilíbrio resultou uma queda feia. Muito feia. Bati fortemente com a cabeça no piso e só me recordo de ter ouvido alguém gritar e de ficar estendido no chão ver as luzes do pavilhão. Entretanto foram surgindo as cabeças dos meus colegas e... acordei passado 40 minutos, em pleno balneário, a desapertar os atacadores das minhas sapatilhas. O "acordar" foi dos momentos mais estranhos que vivi, uma vez que, subitamente, o som dos meus colegas surgiu em crescendo até ser mesmo doloroso, como se eu estivesse a aproximar-me de uma fonte sonora muito poderosa. Acordei assustado, sem saber o que se passou desde a queda até àquele momento e, pior do que tudo isso, sem me lembrar de onde morava, de qual era o meu carro, etc... O facto de ninguém me ter levado a sério aumentou a angústia. Amnésico, bastante confuso e assustado, foi graças à ajuda de um colega de equipa de então (Paulo Sousa) que lentamente recuperei a memória referente a coisas como: onde era a minha casa; como iria do pavilhão para casa; qual era o meu carro; etc...
Mas faltava lembrar-me do que se tinha passado entre a minha queda e o momento em que "acordei". O que se passou nesses quase 40 minutos? Ainda hoje, confesso, não me recordo de nada... E não, não estive a receber assistência fora de campo, nem sequer fui conduzido ao hospital como devia ter acontecido. Pelo que me dizem, continuei a jogar, a fazer leituras e "jogadas", a tomar decisões, a comunicar, a lançar ao cesto (e, pasmem-se, até a marcar!). Mas se era o meu consciente a comandar, como é que eu não me recordava de absolutamente nenhuma das tarefas complexas que tive que ir tentando resolver? Por outro lado, se era o meu subconsciente a comandar, como é possível ter realizado essas mesmas tarefas complexas sem a participação "visível" do meu "consciente"?... Para além da gigantesca dor de cabeça, tantas e tantas dúvidas...
E desde esse dia, como procuro ir transformando as minhas dúvidas em conhecimento, surgiu esta vontade de perceber melhor como é que o nosso desempenho ao serviço de uma equipa pode ser influenciado por este órgão tão poderoso que todos temos: o cérebro!
Para ilustrar o poder do nosso cérebro aqui ficam, para além da minha experiência, dois artigos interessantes:
Basquetebol no European Journal of Neuroscience (Edição de Maio)
Adolescente joga basquetebol mesmo em coma
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